sábado, 21 de setembro de 2013

Muitos gramas de chumbo na memória

O negro Cristóvão sempre vagou solitário por Rio Garça.

Oriundo não se sabe ao certo de onde, comentavam que ele havia cumprido 26 anos de pena. Quando jovem, num acesso de ciúme e fúria, matou a mulher com quatro tiros à queima-roupa. Grávida de quatro meses.

Com uma história dessas, ele que já falava muito pouco com as pessoas, era também evitado pela maioria.

Mas, mesmo sendo taciturno e dono de uns olhos velados, quase sinistros, era homem muito educado, principalmente com as mulheres, com quem se mostrava extremamente respeitoso. Todos o teriam em muito boa conta, não fosse a história do crime.

Chegou à cidade com bem mais de 50 anos, e vivia de realizar pequenos serviços, pesados ou não. Mantinha um quarto alugado na Pensão Espírito Santo, uma casa humilde. Fazia suas refeições em qualquer lugar em que fosse servida comida. Aliás, raramente era visto comendo alguma coisa. Mas sempre podia ser encontrado pelas biroscas, bebericando pinga.

Mesmo com mais de 60 anos, era um homem muito forte. Mas nunca havia se metido em brigas.

Até que em certa madrugada, não se sabe por qual motivo, envolveu-se numa confusão dos infernos com um grupo de estranhos na zona do meretrício. Quebrou o braço de um, rasgou o pescoço de outro com uma garrafa quebrada, e acabou sendo abatido por um monte de tiros, pois o grupo era grande, não era de Rio Garça, e pareciam estar todos portanto armas de fogo.

Cristóvão ficou lá no chão, crivado de balas, e o pessoal fugiu. Não só os assassinos. 

Mais tarde, quando examinava o cadáver, um policial comentou que jamais havia visto alguém com tanto chumbo no corpo.

E olha que Cristóvão já tinha chumbo suficiente na memória.

Autor: Paulo de Souza Xavier
Bom Jesus do Norte, 15/11/2012.

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